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A cultura woke está chegando ao fim?

Foto do escritor: Freitas NettoFreitas Netto

Atualizado: 17 de jan.



O termo "woke”, que traduzindo seria algo como “acordei”, se refere a um movimento social que, nos últimos anos, ganhou muita força colocando questões de justiça social, igualdade e inclusão no centro de discussões sobre política, cultura e o próprio mercado de trabalho.


Com foco na conscientização sobre discriminação racial, de gênero, sexual e social, esse movimento transformou debates, práticas corporativas e até mesmo os valores de empresas e marcas.


Nos Estados Unidos, essas práticas se fortaleceram com eventos como o movimento Black Lives Matter, especialmente após o assassinato de George Floyd em 2020.


A partir daí, grandes corporações passaram a implementar políticas de diversidade, equidade e inclusão (DEI) em busca de ambientes mais justos e representativos.


Muitas empresas adotaram políticas que buscam reduzir desigualdades e promover uma maior representação de grupos marginalizados.


Elas implementaram treinamentos para eliminar preconceitos, ofereceram programas de mentoria para minorias e passaram a considerar a diversidade nas contratações e promoções.


O objetivo era criar ambientes mais justos, tanto no trabalho quanto nas instituições, abordando as desigualdades sistêmicas que existem na sociedade.


Mas, com o tempo, surgiram resistências e questionamentos.


No Brasil, por exemplo, a decisão do Magazine Luiza em colocar apenas negros no programa de trainee 2021 gerou muitos debates.


Inclusive um processo movido por um defensor público pediu indenização de R$ 10 milhões da empresa e chamou o programa de "marketing de lacração”, processo que foi dado como improcedente pela 15ª Vara do Trabalho de Brasília.


Os prejuízos do movimento woke?


Críticos da cultura woke frequentemente apontam seus excessos, afirmando que suas diretrizes teriam levado empresas a prejuízos financeiros e crises de imagem. 


Campanhas publicitárias consideradas forçadas ou desconectadas de seu público geraram o chamado backlash, um contra-ataque político ao resultado desse movimento, em diferentes setores da sociedade, inclusive no mercado corporativo. Essas críticas alimentam a narrativa de que o movimento teria causado mais problemas do que avanços.


Nos últimos meses, grandes corporações começaram a reavaliar suas políticas de diversidade, equidade e inclusão (DEI).


Empresas como Meta, Amazon, McDonald's e Boeing optaram por revisar ou até mesmo abandonar programas voltados para essas causas. E além desses grandes movimentos, pequenas alterações já vão dando sinais dessa mudança.


A Meta, por exemplo, alterou nomes de temas que se referiam à comunidade LGBTQIA+ no Facebook e Messenger. A mudança foi percebida por internautas após a atualização dos aplicativos.  O tema que antes de chamava “Orgulho” passou a ser mostrado como “Arco-íris”. Já o tema “Transgênero” passou a se chamar “Algodão doce”. Por último, o tema “Não binário” é descrito agora como “Pôr do sol dourado”.

Já a Amazon alterou discretamente várias políticas em seus sites públicos voltadas para a proteção dos trabalhadores, incluindo compromissos de “solidariedade” com seus funcionários negros e benefícios de saúde para trabalhadores transgêneros, segundo reportagem do Washington Post.


Uma seção anteriormente chamada “Diversidade, Equidade e Inclusão” agora no site da Amazon se chama “Experiências e Tecnologia Inclusivas”, e a seção “promover DEI através da tecnologia” foi substituída por um compromisso de “melhorar a experiência do funcionário”.


Recentemente, o McDonald's também anunciou que abandonaria práticas de DEI nos EUA, afirmando que se afastaria do compromisso com a diversidade em favor de uma discussão mais centrada no desempenho comercial com os fornecedores.


Esses sinais indicam que muitas empresas estão se distanciando de iniciativas de diversidade, focando mais em suas operações comerciais do que em suas posturas sociais.


Este movimento reflete um crescente sentimento mais conservador, amplificado pela reeleição de Donald Trump, que levou muitas corporações a repensarem suas estratégias para se manterem longe de controvérsias.


Em entrevista a DW Brasil, Lily Zheng, especialista em DEI, afirmou que “cada líder corporativo agora lida com o fato de que DEI em 2025 será algo muito mais controverso, será de muito mais risco, e isso será uma questão que esses líderes terão que gerenciar”.


Essa mudança ocorre, em parte, devido ao aumento de processos judiciais e campanhas online de grupos conservadores que alegam sofrer "discriminação reversa".


Críticas também às questões de gênero


O debate sobre o movimento woke vai além das questões LGBTQIA+ e raciais. Ele também abrange as mulheres e o feminismo, que muitas vezes são alvos de discursos contrários.


Recentemente, Mark Zuckerberg deu uma entrevista ao podcast “The Joe Rogan Experience” e lamentou que a cultura corporativa tenha se afastado da “energia masculina” e defendeu “celebrar um pouco mais a agressão”.


O que nos lembra também do caso recente no Brasil, do Tallis Gomes, fundador da Easy Taxi e, até então, presidente da G4 Educação, que causou polêmica ao afirmar que seria contra sua mulher ocupar o cargo de CEO em uma empresa.


Em suas palavras: “Deus me livre de mulher CEO”. Ele justificou sua posição dizendo que mulheres nesses cargos passam por um processo de “masculinização” e que priorizam a carreira em detrimento do lar, dos filhos e do marido.


Esse tipo de declaração revela uma resistência enraizada contra a ascensão feminina em posições de liderança. Enquanto o movimento woke busca promover a igualdade de gênero, falas como essas reforçam a luta contínua contra a visão tradicional que ainda associa as mulheres exclusivamente ao espaço doméstico.


Reflexo das mudanças sociais


Se a reação ao movimento woke está ganhando força, é impossível negar os avanços significativos que ele trouxe, especialmente no Brasil.


Um exemplo de como o movimento woke influenciou a cultura pode ser visto no documentário dos 25 anos do Big Brother Brasil, divulgado este ano. Em vários momentos do documentário há fortes reflexões sobre atitudes de edições do passado que hoje seriam inaceitáveis.


No início, o programa retratava questões de forma superficial ou até vexatórias, mas, com o tempo, se tornou palco de discussões e influência nacional sobre inclusão e respeito às diferenças.


No BBB11, por exemplo, a participação de Ariadna Arantes, a primeira mulher trans no programa, foi um marco importante. A participante, que era cabeleireira, foi eliminada no primeiro paredão.


Sua eliminação foi cercada de transfobia. No dia do seu paredão, o jornal Meia Hora publicou uma capa ofensiva: “Ariadna’s Coiffeur: corto cabelo e pinto”, uma piada transfóbica que só recebeu um pedido de desculpas público 11 anos depois:


"Pedimos perdão não apenas a Ariadna como a todas e todos agredidos por essa capa de 11 anos atrás. Não tem graça, assim como outras piadas infelizes que, no passado, eram corriqueiras, embora causassem sofrimento. Além de nos envergonhar, não reflete a nossa atual linha editorial".


Outro exemplo significativo foi a trajetória de Marcelo Dourado no BBB10. Dourado foi acusado de homofobia devido a declarações polêmicas durante sua participação, como o uso de termos como "orgulho hétero" e "resistência heterossexual". 


Anos depois, ele fez um mea culpa público, reconhecendo o erro e explicando que:  “Eu era um cara muito mais ignorante do que sou hoje. E eu não percebi ali na hora que a frase que o meu adversário falava, 'o mundo é gay', era uma frase de inclusão", declarou.


"Na minha cabeça limitada, eu pensava que era uma frase afirmativa, genérica. Eu não percebi a importância daquilo para as pessoas que estão envolvidas nessa comunidade e que são constantemente vítimas de violência. A resistência pertence as minorias, e nenhum hétero foi espancado até a morte por sua sexualidade”.


Esses casos ilustram a importância do movimento woke como força transformadora. Embora imperfeito, ele impulsionou diálogos essenciais e mudanças sociais que dificilmente ocorreriam sem pressão pública.


O documentário nos lembra que o progresso social é contínuo e que as mudanças podem ser reinterpretadas ao longo do tempo. O que hoje parece polêmico ou exagerado pode, no futuro, ser reconhecido como um passo fundamental para a construção de uma sociedade mais justa e inclusiva.


O futuro da cultura woke


A cultura woke não está em declínio absoluto, mas a reação das grandes empresas à política de diversidade reflete uma tentativa de se alinhar a um novo cenário mais conservador, mas isso não significa que os princípios de inclusão e justiça social desaparecerão. O movimento continua, apesar das mudanças nos discursos corporativos.


Apesar do recuo de empresas que preferem adotar posturas mais neutras e evitar controvérsias, há organizações que seguem na contramão, reafirmando seus compromissos com a diversidade e a inclusão.


Um exemplo é a Apple, que recentemente instou seus acionistas a rejeitarem uma proposta de um grupo conservador que colocaria em risco suas políticas de diversidade, equidade e inclusão.


Para a Apple, essas iniciativas continuam sendo fundamentais para seu ambiente corporativo e estratégico. Da mesma forma, a varejista Costco reforçou que a diversidade é "essencial e apropriada" para o sucesso empresarial, enquanto a Delta Airlines destacou que essas políticas são fundamentais para atrair e reter os melhores talentos.


Essas posições mostram que, mesmo em um ambiente polarizado, algumas empresas estão dispostas a enfrentar riscos e críticas em nome de valores que consideram inegociáveis.


O que provavelmente veremos é a evolução do movimento woke, com uma adaptação mais equilibrada e menos performática. Em vez de campanhas superficiais, o público passará a exigir ações mais consistentes e autênticas, de empresas e instituições, que realmente refletem os valores de inclusão.


A cultura woke pode estar em transformação, mas sua importância e impacto permanecem profundos.


Como você vê essa evolução e os desafios que ela apresenta? Compartilhe sua opinião nos comentários.


 

Por: Antônio Netto

Gerente de Planejamento, liderando estratégias de marketing para o varejo. Com vasta experiência, também sou Professor, mestrando em Administração, e consultor em marketing digital, focado em inovação e prática.

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