Entre o retorno aos escritórios e a busca por flexibilidade, comparei os resultados de uma enquete com minha rede no Linkedin com o panorama global dos modelos de trabalho; confira
Nos últimos anos, o mundo do trabalho passou por mudanças profundas e aceleradas, impulsionadas pela pandemia da Covid-19. O que começou como uma adaptação emergencial ao home office se transformou em um debate global sobre o futuro do trabalho.
A ascensão do modelo remoto trouxe promessas de flexibilidade, aumento de produtividade e bem-estar dos funcionários, mas, com o passar do tempo, essas promessas têm sido reavaliadas à medida que grandes empresas começam a puxar seus colaboradores de volta aos escritórios.
O declínio do Home Office total
Dados do IBGE (PNAD Conínua) de 2022 mostraram que cerca de 9,5 milhões de brasileiros estavam trabalhando remotamente, um número nunca antes visto no país.
A mesma pesquisa mostra que quase metade das pessoas que trabalham 100% do tempo presencialmente gostariam de trabalhar de casa, total ou parcialmente.
A expectativa de muitos era que o modelo remoto se tornasse permanente, especialmente considerando as vantagens que ele oferecia, como economia de tempo com deslocamento, maior flexibilidade e equilíbrio entre vida profissional e pessoal.
No entanto, essa visão otimista começou a desmoronar conforme a pandemia foi se flexibilizando e chegando ao fim. Grandes empresas globais, que antes eram defensoras do trabalho remoto, estão agora exigindo a volta dos funcionários aos escritórios.
Empresas como Amazon, Google e Meta já exigem a presença de seus colaboradores por pelo menos três dias na semana, e algumas, como a Disney, estão indo ainda mais longe, solicitando quatro dias no escritório.
Um levantamento recente da Infojobs mostrou que 94,8% das vagas de trabalho no Brasil em 2024 são para posições presenciais, enquanto apenas 2,7% ainda oferecem o regime Home Office total.
Mas o que motiva essa reversão?
A resposta mais comum das lideranças empresariais é a produtividade. A ciência, entretanto, traz dados mais complexos e nem sempre conclusivos.
O WFH Research, uma das maiores autoridades em estudos sobre o trabalho remoto, destaca que, em modelos totalmente remotos, a produtividade pode sofrer uma queda de até 20%.
Um estudo realizado pelo MIT em uma empresa indiana observou uma redução de 18% na produtividade de funcionários trabalhando de casa em comparação com os que estavam no escritório.
Por outro lado, estudos como o realizado pelo Federal Reserve de Nova York mostraram que a queda de produtividade em call centers, por exemplo, foi de apenas 4%.
Essas variações sugerem que o impacto do home office na produtividade não é uniforme e depende de fatores como o setor de atuação, a complexidade das tarefas e a infraestrutura oferecida pelas empresas para o trabalho remoto.
Modelo Híbrido: o melhor dos dois mundos?
Diante desse cenário, o modelo de trabalho híbrido surgiu como uma solução de compromisso entre as empresas e os trabalhadores.
A proposta de combinar alguns dias no escritório com outros dias de home office parece, em teoria, unir o melhor dos dois mundos: a interação social e a colaboração presencial com a flexibilidade e o conforto de trabalhar remotamente.
No Brasil, o modelo híbrido é particularmente popular. De acordo com um estudo da JJL Consultoria, 86% das empresas brasileiras já adotam essa modalidade, uma taxa bem acima da média global de 71%.
Entre as empresas brasileiras, 45% adotaram o regime de dois dias presenciais e três dias remotos por semana.
Mas o modelo híbrido também tem seus desafios. Empresas enfrentam problemas com o baixo comparecimento aos escritórios e a dificuldade de criar um sentimento de pertencimento entre os colaboradores, a famosa “cultura organizacional”.
Além disso, muitas organizações ainda lutam para encontrar a melhor maneira de medir a produtividade e o engajamento de seus funcionários nesse novo formato.
No entanto, o regime híbrido parece ser o caminho mais sustentável a longo prazo. O WFH Research indica que o modelo híbrido não apresenta as mesmas quedas de produtividade observadas no trabalho remoto completo.
Um estudo recente da Universidade de Harvard, que analisou a performance de trabalhadores híbridos em uma ONG de Bangladesh, mostrou que aqueles que trabalhavam três dias por semana de casa apresentaram uma performance ligeiramente melhor do que aqueles que compareciam ao escritório em quatro ou mais dias.
Além disso, a flexibilidade proporcionada pelo trabalho híbrido é um fator importante para a atração e retenção de talentos. De acordo com a consultoria Robert Half, quase oito em cada dez dos trabalhadores brasileiros (76%) preferem o modelo híbrido, e quase quatro em cada dez (38%) afirmam que procurariam outro emprego caso fossem obrigados a retornar ao regime 100% presencial.
A flexibilidade, portanto, não é apenas uma questão de conveniência, mas também de competitividade para as empresas que buscam atrair os melhores profissionais.
Pesquisa com minha rede no LinkedIn
Com o intuito de entender melhor a realidade dos profissionais que fazem parte da minha rede no LinkedIn e se ela refletia a realidade das pesquisas globais, realizei uma enquete sobre o modelo de trabalho em que eles estão inseridos atualmente. A pesquisa teve 207 respostas e revelou o seguinte panorama:
40% dos votantes indicaram que estão trabalhando no modelo presencial 100%.
36% estão em home office 100%, trabalhando remotamente em tempo integral.
25% estão no modelo híbrido, sendo que:
- 12% trabalham mais dias em casa, e
- 13% trabalham mais dias no escritório.
Ainda que minha pesquisa não tenha caráter científico, os resultados refletem algumas das tendências, mas também trazem detalhes bem diferentes.
Modelo híbrido em ascensão? Esse dado representa uma discrepância do resultado da minha enquete com o cenário brasileiro, onde 86% das empresas já adotaram essa prática. Entretanto, na minha pesquisa, apenas 25% dos profissionais estão de fato nesse modelo.
Lembrando que, segundo a Consultoria Robert Half, 76% dos trabalhadores brasileiros prefeririam o modelo híbrido. Essa disparidade sugere que, embora muitas empresas estejam formalmente adotando o híbrido, a realidade de boa parte dos profissionais, ao menos entre os votantes da minha pesquisa, ainda não reflete essa prática de maneira abrangente.
Pressão pelo o retorno ao escritório: Os resultados da minha pesquisa no LinkedIn refletem significativamente o estudo da Capterra, de 2024, que aponta que o modelo presencial ainda é o mais comum, com 45% das empresas globalmente adotando essa prática. Em minha pesquisa, 40% dos profissionais relataram estar no modelo presencial 100%, um número alinhado com essa média global.
Home Office 100%: Curiosamente, na minha enquete, 36% dos votantes indicaram que ainda estão trabalhando remotamente de forma integral, um número consideravelmente maior do que os 2,7% apontados pelo levantamento da Infojobs. Esse dado pode refletir o perfil dos votantes da minha rede, que em sua maioria atuam em áreas como tecnologia, marketing digital e design, setores onde o home office total ainda é viável.
Perfil dos votantes da minha enquete
A maioria dos votantes da minha rede do Linkedin atua em Marketing e Comunicação, seguidos por Tecnologia e Design e Consultoria e Estratégia, que juntas representam a maior parte dos profissionais que participaram da enquete.
Ao considerar o perfil dos votantes que estão em 100% presencial, destacam-se os profissionais de comunicação corporativa e jornalismo, atuando em funções que demandam interação direta, como assessoria de imprensa e eventos.
Marketing e publicidade também têm forte presença, especialmente em cargos que envolvem coordenação de campanhas e relacionamento com clientes.
Além disso, um dado interessante é a quantidade de designers que atuam nesse regime, o que sugere uma pressão das empresas para o retorno ao escritório, mesmo em áreas que poderiam ter mais flexibilidade.
Atendimento ao cliente e vendas completam essa lista, refletindo a necessidade de contato direto e interação constante com os clientes.
Por outro lado, no home office 100%, predominam profissionais de tecnologia e desenvolvimento de software, que podem trabalhar de forma autônoma com pouca necessidade de interação presencial.
Marketing digital, com funções como especialistas em SEO, redes sociais, e criação de conteúdo, também é uma área forte nesse grupo, dada a natureza digital das tarefas.
Além disso, alguns designers e profissionais de produção de conteúdo aproveitam a flexibilidade do trabalho remoto, especialmente freelancers e redatores que gerenciam suas demandas de forma independente.
No modelo híbrido com mais dias no home office, predominam profissionais de marketing estratégico, comunicação, e branding, que alternam entre a presença física para reuniões e a concentração em casa para tarefas mais analíticas.
Por fim, no híbrido com mais dias no escritório, observamos uma maior presença de profissionais de relações públicas, comunicação corporativa, e gerenciamento de produto e marketing. Esses profissionais equilibram a interação presencial com stakeholders, imprensa e equipes, mantendo a proximidade necessária para o desenvolvimento de estratégias.
Além disso, vendas e atendimento figuram nesse grupo, onde a presença física é importante para reuniões e coordenações, mas as tarefas de planejamento e análise podem ser realizadas remotamente.
Um equilíbrio delicado
Um ponto central no debate sobre os modelos de trabalho é a produtividade, mas é importante lembrar que o trabalho não é apenas uma questão de rendimento.
O bem-estar dos funcionários também desempenha um forte papel na sua performance e na retenção a longo prazo. O modelo híbrido, além de equilibrar os requisitos de presença física e remota, também contribui para uma maior sensação de bem-estar dos profissionais.
Pesquisas apontam que o regime híbrido oferece um equilíbrio entre as demandas profissionais e a vida pessoal, permitindo que os trabalhadores encaixem compromissos como consultas médicas e atividades de lazer em suas rotinas, sem sacrificar sua produtividade.
Esse equilíbrio, por sua vez, impacta diretamente na satisfação no trabalho e na redução de estresse, o que pode, a longo prazo, aumentar o engajamento e a performance.
Entretanto, a flexibilidade excessiva também pode trazer desafios. Em alguns casos, os profissionais podem sentir que estão “sempre trabalhando”, o que leva ao esgotamento e a uma confusão entre vida pessoal e profissional.
Por isso, é importante que as empresas estabeleçam políticas claras e ofereçam suporte aos seus funcionários para que eles possam gerenciar melhor suas rotinas.
Por: Antônio Netto
Gerente de Planejamento, liderando estratégias de marketing para o varejo. Com vasta experiência, também sou Professor, mestrando em Administração, e consultor em marketing digital, focado em inovação e prática.
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